Saturday, December 26, 2009

Moçambique precisa de paz preventiva

Segundo Dom Jaime Gonçalves
O clérigo diz que os principais signatários estão a violar os termos do Acordo Geral de Paz, o que se traduz na instabilidade política, social e económica do país.

O arcebispo da Beira, Dom Jaime Pedro Gonçalves, disse, ontem, naquela urbe, que os moçambicanos precisam de moldar a sua paz, considerando que ela está em risco tendo em conta a falta de justiça em muitas instituições e organizações nacionais, entre elas políticas.

“Não restam duvidas que os cenários que assistimos nos últimos tempos no nosso país, com destaque para as confrontações políticas durante a campanha eleitoral, são sinónimos de que precisamos de uma paz preventiva. De uma reconciliação, passando por uma justiça igual e não tribal, étnica ou partidária. Não se pode construir uma sociedade sólida e feliz sem justiça. O que se constrói na injustiça não tem futuro”.

Dom Jaime, que falava à imprensa por ocasião do Natal, lamentou o facto de muitos concidadãos, segundo disse, estarem a transformar agendas nacionais em pessoais, étnicas, regionais ou políticas, relegando para segundo plano aquilo que foi definido nos vários Acordos de Roma, que culminaram com a assinatura da paz em Outubro de 1992.

“Assinamos o acordo de Roma e definimos vários caminhos rumo a uma democracia sã. Hoje, volvidos 17 anos, vejo com tristeza que parte daquilo que foi acordado para o bem comum dos moçambicanos está sendo violado pelos signatários dos acordos, e põe em causa a reconciliação, justiça e, por conseguinte, a paz. Portanto, precisamos de uma paz preventiva” frisou o clérigo.

Para aquele prelado, neste natal, os moçambicanos deveriam aproximar os objectivos comuns que visam o desenvolvimento do pais, tal como o “filho de Deus, Jesus Cristo, que lutou para unir os homens há mais de dois mil anos atrás, morrendo na cruz para salvar a humanidade”.

Dom Jaime lamentou, por outro lado, o facto de alguns partidos, que não citou, estarem a utilizar jovens para actos ilegais, ou seja, não recomendáveis para uma boa ordem social.

“É um perigo grave para o futuro do país. Podem ter a certeza que estes jovens, que amanhã serão seguramente adultos e nossos dirigentes, vêm hoje na injustiça uma forma de conquistar o poder e o dinheiro, daí que para eles a injustiça será o caminho certo.”

MANIFESTAÇÕES DA RENAMO

Quanto às manifestações agendadas pela Renamo, Dom Jaime negou fazer um juízo, mas adiantou que as mesmas fazem parte da vida de um partido, num país democrático como Moçambique.

“Existem leis nestes país que definem como podem ou devem ser feitas as manifestações. Não é só pelo facto de ser uma manifestação que o acto deve ser condenado. Portanto, se a Renamo seguir os critérios, acho que não cabe a mim julgar o posicionamento da Renamo. Contudo, deixo apelo para que as mesmas não prejudiquem a nação”.

Fonte: O País online

Monday, December 07, 2009

Contra a Ditadura do Medo

Canal de Opinião : por Marcolino Moco (*)

Carta de Marcolino Moco, ex-secretário-geral do MPLA e ex-primeiro-ministro de Angola, a Mateus Julião Paulo "Dino Matross", ex-ministro da segurança angolano

Maputo (Canalmoz) - Era para nos tirarem o medo dos estrangeiros e nos trazerem o vosso medo?! Eu recuso-me a tremer perante qualquer tipo de novos medos. É este o meu manifesto contra o medo e contra uma ditadura do silêncio que não aceito.

Caro Camarada Dino Matross

Após consulta à minha família nuclear e alargada, que me deu todo o apoio, e até me surpreendeu, ao declarar que eu nem devia ter ido ter consigo, mando-lhe este pequeno memorando do nosso encontro do dia 24 de Novembro, na Assembleia Nacional.
Na verdade, como deve ter sabido, a minha primeira decisão era não ter ido ter consigo, pela forma como fui abordado, como se eu fosse um desocupado, à chamada de um senhor misericordioso; e também não iria ao seu encontro por desconfiar que me iria dar lições atávicas, sobre as minhas opiniões, como cidadão e académico, em relação ao momento constituinte, que tem suscitado uma grande audiência em Luanda e no exterior, já que vocês, sem nenhum pejo, barraram todo o contraditório em relação ao interior do país, simulando uma grande generosidade em fazer participar o país na elaboração de uma Constituição que vocês já sabem qual será.
Só que com o seu cinismo, conseguiu que o camarada Faustino (Muteka) me convencesse que seria uma conversa entre camaradas que iriam trocar ideias, neste momento importante.
Aquilo foi mais degradante, não sei quantas vezes, do que o meu encontro com os camaradas João Lourenço, Paulo Jorge e Nvunda, em 2001, quando eu opinava publicamente sobre a urgência da paz. Devo reconhecer hoje, ter sido injusto com eles porque, foram certamente pessoas como o camarada Matross que os empurraram para aquele cenário, que até não foi tão triste assim, até porque bastante cordial.
Vocês não conseguem nem ter sentido de humor e um mínimo de informalismo, como a camarada Joana Lina, que quase não aceitou os meus cumprimentos, toda ela feita deusa de uma religião que eu não professo.
Pela forma arrogante como me falou não vou mais insistir nas opiniões que tentei trocar consigo, porque vi que o senhor não estava interessado em dialogar, mas apenas em tentar impor-me ideias que – diga-se, mais do que imaginava, horrorosamente atávicas.
No entanto, quero que fique bem claro que, para mim, as conclusões daquele encontro são as seguintes:
1. - Reitero, por minha livre vontade, que continuo ligado sentimentalmente ao MPLA (talvez deixe de fazer essa referência pública, e deixe de referir que vocês são meus amigos, se isso tanto vos perturba) conservando o meu respeito ao Presidente do Partido, mas sem temor (como temer um combatente na luta contra o medo colonial e não só!?). O que penso, a partir do nosso último encontro (pode ser que esteja enganado!), é que são vocês que o apoquentam com a ideia de que qualquer referência a ele, desde que seja crítica (mesmo quando positiva) é falta de respeito, é “falar mal do Chefe”, etc., etc., etc.

2. - Fica claro que como docente, conferencista e cidadão, ninguém, mas absolutamente ninguém, me obrigará a distorcer as minhas convicções científicas, a favor de ideias de um partido qualquer, por mais maioritário que seja e por mais da minha cor que seja. É aí que vocês inventam que eu falo mal do Presidente do Partido, quando as referências são feitas a um cidadão que é Chefe de Estado e especialmente na sua qualidade de Chefe de Governo, num momento importante, em que todos nós temos o dever cívico de contribuir sem medo. Para mim o tempo da vovó Xica de Valdemar Bastos: “não fala política”, já lá vai há muito tempo. Paradoxalmente, o camarada Dino Matross, foi um dos grandes obreiros desta gesta. É pena! Era para nos tirarem o medo dos estrangeiros e nos trazerem o vosso medo?! Eu recuso-me a tremer perante qualquer tipo de novos medos.

3. - Aquelas referências que fez, de forma tão sobranceira e até ameaçadora, sobre o camarada Chipenda (por quem, da lista, nutro um grande respeito), do Paulino Pinto João (degradante!) e de Jonas Savimbi (se não andasse distraído saberia que eu nunca entendi bem das suas razões) foi das coisas mais inacreditáveis na minha vida. O camarada Matross a deixar transparecer que me presto a mendigar os vossos favores ou que tenho medo de perder a vossa protecção? Ainda não se apercebeu que não?!
Neste ponto, saiba que a minha família e amigos, sobretudo os que vivem no Huambo e um pouco por todo o país, reiteraram-me o seu total e pleno apoio, no sentido de que nem que eu venha a comer raízes e ervas (que até são mais saudáveis que as comidas importadas) não irei pedir esmolas a ninguém, o que não significa dispensar os meus direitos e garantias perante as instituições competentes do Estado.

4. - Declino o convite que o camarada diz ter pedido para mim, ao Presidente do Partido, para ser convidado ao VI Congresso do MPLA. Não aceito a perspectiva chantagista, condicionante e ameaçadora que deixou transparecer do tipo: “se não for então que não se arrependa” ou “então será abandonado”.
Como costumo dizer, desde a “Queda do Muro de Berlim”, em 1989, que estou preparado, sobretudo espiritual e psicologicamente, para não viver a custa de lugares em qualquer partido. E a mensagem que passo sempre aos meus alunos – e tenho moral para isso – é esta: “preparem-se como bons profissionais, para a vida; podem aderir a partidos ou assumir cargos políticos, mas não dependam deles em nenhum sentido, porque podem ser enxovalhados, em alguma altura”.

5. - Espero nunca mais ser perturbado quando falar, nas minhas vestes de cidadão e estudioso do Direito. Se a questão é alguma comunicação social, que ainda não se vergou às vossas pressões, andar a divulgar as minhas ideias, o problema não é meu. Mandem fechar tudo o que não fale a vosso favor e deixem-me em paz.
6. - Olhem à volta e vejam como arrastam o MPLA à situação de ser o mais retrógrado dos então chamados partidos progressistas de África! Incapazes de perdoar, do fundo do coração (já nem falo da UNITA e dos chamados “ fraccionistas”) até os próprios fundadores do nosso glorioso Partido, como os irmãos e primos Pinto de Andrade; e um Viriato da Cruz, de cujo punho brotaram estrofes esplendorosas, para uma África chorosa mas em “busca da liberdade”, usando palavras de outro vate da liberdade; o Viriato da pena leve e elegante que riscou o próprio “Manifesto”, donde nasceria uma das mais notáveis siglas da humanidade; sigla que vocês vão, hoje, transmitindo às novas gerações, como o símbolo do culto e da correria atrás de enxurradas de dinheiro e de honrarias balofas!
Triste espectáculo que fingem não ver!
Com certeza, já mandaram chamar o nosso “mais novo”, o deputado Adelino de Almeida para nunca mais escrever, como escreveu aquele artigo tétrico, no “Semanário Angolense”, após o desaparecimento do malogrado, talentoso e insigne tribuno, também nosso “mais novo” o ex-deputado André Passy. Dos textos dilacerantemente irónicos do ex-deputado Januário, mas exprimindo com arte as misérias (sobretudo do foro espiritual) que estão a ser criadas neste país, provavelmente nem se importam de reparar: pois, para além de ser já um “ex” é um “mijão de calças”, mesmo aos quase 50 anos, como o camarada Matross gosta de taxar “carinhosamente” todos os jovens que despontam com ideias diferentes das vossas. Por maioria de razão, o mesmo destino (cesto de papéis!) deram, certamente, àquele pujante libelo acusatório de um jovem, a sair dos vinte anos, que me fez chorar (das poucas vezes que chorei, em vida!) onde a vossa e minha geração são postas diante de uma realidade, nua e crua, do amordaçar de sonhos e liberdades que vocês nos anunciaram a todos, mas que ele e os da sua geração só os encontram nos livros de história e no canto esperançoso dos poetas (falo do jovem Divaldo Martins, que também escreveu no “Semanário Angolense”!).

7. - E sobre todas estas coisas, não mais falarei com o camarada Dr. Dino Matross. Estou indisponível. A não ser em debate público.

Política, na verdade, diversamente do que vocês querem impor, contrariando (mesmo neste tempo de democracia pluralista), o grande Agostinho Neto, que disse não dever ser um assunto de “meia dúzia de políticos”, terá que ser, e será, inexoravelmente, uma questão fora do esoterismo a que vocês a querem submeter, em Angola.
Estou cansado das vossas chantagens e humilhações. Por enquanto, é este o meu manifesto contra o medo e contra uma ditadura do silêncio que não aceito.
Obs.: Como vocês gostam de distorcer as coisas, guardo cópia deste documento que será distribuído a meus familiares e amigos e, quem sabe, chegará aos militantes de corações abertos, que ainda não os fecharam, ante a vossa inigualável capacidade de manipulação! Quem sabe a todo o país e ao mundo, que para vós não passa dos arredores da Mutamba e da marginal da baía de Luanda?!
Sem mais
Luanda, aos 29 de Novembro de 2009
Marcolino Moco (Militante livre do MPLA)"


(*) Título da responsabilidade do CanalMoz

Fonte: CanalMoz 2009-12-07 06:07:00